🔥Lula ‘no epicentro’ de Israel x Irã
Conflito no Oriente Médio é usado nos apps para alimentar divisões políticas no Brasil
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🗞️ O que está acontecendo?
Quem acredita que a guerra entre Israel e Irã é um conflito distante da realidade brasileira está muito enganado. Dados da Palver mostram que, desde a última sexta-feira (13), quando Israel disparou mísseis contra Teerã, mais de 4,1 milhões de usuários de WhatsApp e Telegram foram impactados por pelo menos uma mensagem que falava sobre o mais novo conflito do Oriente Médio em português.
Nesse período, mais de 12 mil postagens únicas mencionando ao menos um dos dois países circularam por 518 grupos públicos, e a maioria estava em formato de vídeo. Alguns artificialmente gerados.
O maior problema, no entanto, é que ao menos três das mensagens monitoradas pela Palver sobre a nova guerra entre Israel e Irã continham pura desinformação. Não passavam de conteúdos já amplamente desmentidos por checadores e que tentam — de forma inconsequente — refletir no quadro político nacional toda a tensão e polarização vista no resto do mundo por conta desse conflito.
📊 O contexto importa:
É de conhecimento que a relação entre Israel e Irã é historicamente ruim e marcada por uma rivalidade que tem raízes na Revolução Iraniana de 1979. Naquele ano, o Irã dos aiatolás rejeitou categoricamente a existência de Israel e passou a se referir a esse país como sendo o “pequeno Satã”, expressão pejorativa que não alivia em nada as tensões. Também se sabe que o Irã apoia publicamente as causas palestinas e que alimenta uma rede de aliados que inclui o grupo terrorista Hezbollah (que atua na fronteira com o Líbano).
Aos olhos de Israel (e de outros países do Ocidente), o Irã encarna, por sua vez, uma ameaça direta à estabilidade mundial. Estaria desenvolvendo armas nucleares sem supervisão e já poderia ter realizado ataques militares secretos em diversos pontos do planeta.
O que fica claro é que o conflito reiniciado na última sexta-feira entre as duas nações é só o mais novo capítulo dessa novela, mas em cinco dias já deixou ao menos 224 mortes no Irã e 24 em Israel. O número de feridos cresce a cada hora.
🎥 O que viralizou:
Desde a última sexta-feira, ao menos 22 mensagens sobre a guerra entre Israel e Irã viralizaram em grupos públicos de WhatsApp do Brasil e levaram da Meta o símbolo de seta dupla que identifica “conteúdos encaminhados com frequência”.
Nesse universo há quem defenda Israel com unhas e dentes, afirmando que o país está “fazendo um favor à humanidade” ao atacar o Irã. Mas também há críticas severas ao governo de Benjamin Netanyahu, acusado de desrespeitar direitos humanos ao iniciar uma nova guerra (sem ter encerrado o conflito com o grupo terrorista palestinos Hamas).
Mas o que realmente chama a atenção nas mensagens mais virais do WhatsApp sobre a nova guerra são as tentativas de vincular o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (e o Brasil) ao conflito.
Diversas mensagens, especialmente em formato de vídeo, têm circulado alegando que Lula teria se aliado ao Irã e tomado uma posição favorável ao regime de Teerã no conflito.
Mensagens mais extremas sugerem — sem qualquer prova — que o presidente teria oferecido urânio ao Irã e, portanto, entrado no radar dos Estados Unidos como sendo o líder de um governo “perigoso”.
Essas narrativas são completamente falsas, já foram checadas diversas vezes e visam gerar divisões políticas internas no Brasil. É difícil entender quem ganha com isso.
🚨 O que dizem as checagens?
É verdade que, em 2023, dois navios de guerra iranianos atracaram no porto do Rio de Janeiro gerando desconforto diplomático. As embarcações IRIS Makran e IRIS Dena permaneceram no país por cerca de uma semana com autorização da Marinha e apesar de críticas dos Estados Unidos. Mas são falsos os vídeos que dizem que, nesse período, o Brasil deu urânio ao Irã — como aparecem nos grupos de WhatsApp nesta semana. A Polícia Federal chegou a investigar o caso da atracação dos navios, mas encerrou o inquérito em 2024 sem identificar qualquer irregularidades. Esses conteúdos já foram desmistificados pelo Boatos.org e pela Reuters, por exemplo.
Também é falso que os Estados Unidos, a pedido do senador republicano Ted Cruz, esteja investigando o Brasil por estar municiando Teerã com urânio. Vídeos que fazem essa acusação não tem qualquer embasamento em fatos.
Outras mentiras já detectadas pelos checadores sobre o novo conflito entre Israel e Irã tem a ver com a manipulação de imagens e o uso de IA. Imagens e vídeos estão sendo falsamente conectados à guerra iniciada na sexta. Alguns deles são antigos — como o que supostamente mostra mísseis caindo em Israel. Outros são gerados artificialmente — como o que Netanyahu aparece falando português.
💬 Por que isso importa?
A guerra entre Israel e Irã não se limita ao Oriente Médio. Gera debates, discussões e alimenta os aplicativos com desinformação. A tentativa de associar Lula ao conflito deixa claro que os brasileiros podem detestar o presidente, mas devem ficar atentos para não nutrir tentativas de manipulação desassociadas da nossa realidade. O Brasil já tem seus próprios problemas. O governo federal também. Jogar mais lenha (mentiras) nessa fogueira só gera o esgarçamento do tecido social do nosso país.
E mais…
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, voltou a ser alvo de uma intensa campanha de ataques em aplicativos de mensagem nos últimos sete dias. Monitoramento da Palver identificou ao menos 53 mensagens únicas mencionando seu nome, com potencial de alcance de quase 190 mil usuários. Dois vídeos concentram a maior parte da viralização. Em um deles, uma mulher acusa Marina de estar alinhada com interesses internacionais — principalmente da França, Alemanha e Inglaterra — e de tentar barrar projetos de infraestrutura, como a BR-319, que facilitariam o escoamento da produção agrícola brasileira. O conteúdo sugere que a ministra age contra o agronegócio nacional e convoca trabalhadores do setor a reagirem, insinuando que o silêncio seria conivente com um suposto projeto de sabotagem econômica levado a cabo pelo governo federal. No segundo vídeo, gravado no Acre, Marina é responsabilizada por ações de despejo e repressão a pequenos produtores rurais no Norte do país. A atuação da ministra e do ICMBio é descrita em tom inflamado como sendo “tirânica”, “uma barbárie” e até “exorcista”. O conteúdo acusa a ministra e o PT de contribuírem para a miséria da região e de atuarem contra os interesses do trabalhador rural. Vale ainda destacar que o fato de a Procuradoria-Geral da República ter arquivado queixa aberta contra o senador Plínio Valério (PSDB-AM) por ter dito que enforcaria a ministra também fez com que o nome de Marina ficasse entre os assuntos mais comentados da semana.
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Metodologia desta edição
Query 1: (irã OR israel* OR iraniano)
Query 2: ("marina" OR "MARINA silva")
Período: 13 a 17 de junho de 2025
Recorte idiomas: Português
Plataformas observadas: Grupos públicos de WhatsApp e Telegram
Ferramentas de apuração: Palver.com.br
p.s: A Lupa segue o Código de Ética da International Fact-Checking Network desde sua criação e tem a transparência e o apartidarismo como principais premissas de trabalho.
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Obrigada por ler a 🔥Ebulição!